sexta-feira, 21 de março de 2014

Escritoras adolescentes ganham espaço no mercado editorial

Influenciadas pela popularização do gênero young adult, jovens autoras paranaenses começam suas carreiras cada vez mais cedo

Reportagem Victoria Tuler

Em 2012, a italiana Melissa Panarello, então com 18 anos, chamou atenção do público com o polêmico Cem Escovadas Antes de Ir para a Cama; Anne Frank, num caso atípico, teve seu diário publicado postumamente em 1947; A inglesa Mary Shelley, autora do célebre Frankenstein, concluiu o clássico da ficção científica quando tinha apenas 19 anos. Apesar de ser possível enumerar alguns exemplos, encontrar jovens autoras com carreiras bem sucedidas não é uma tarefa fácil. Afinal, escritoras adolescentes estão em duas categorias minoritárias no cenário literário nacional: mulheres e menores de 20 anos.

Uma pesquisa recente feita pela Universidade de Brasília (UnB) revelou que o escritor brasileiro contemporâneo médio é homem, branco, de meia idade, com ensino superior completo e morador do eixo Rio-São Paulo. Inspiradas por autores consagrados e usando a internet como ferramenta, garotas cada vez mais jovens têm lutado para abrir portas e conquistar seu espaço nas prateleiras das livrarias – e estão conseguindo.


Eduarda Kiame, autora da trilogia "Elfos Urbanos" (Foto: divulgação)

Jovens autoras

A universitária Eduarda Kiame, 18, é fã de literatura fantástica desde criança. Aos 13 anos, escreveu a história de Anna, uma garota meio-elfa. Assim nascia
A Escolha, primeiro volume da trilogia Elfos Urbanos, que seria publicado um ano depois. A continuação da saga, entitulada A Traição, chegou ás lojas em 2010, quando a autora ainda estava no ensino médio. Eduarda explica que parte da influência para começar sua carreira precocemente veio de suas obras e autores favoritos, mas os acontecimentos marcantes da adolescência também foram grandes motivações: “A minha inspiração não vem só da literatura ou das artes. As coisas do cotidiano trazem fatos novos para meus livros”.

A experiência pessoal também é o motor das irmãs Mônica e Monique Sperandio, 20. As gêmeas curitibanas, que estudam Letras na Universidade Federal do Paraná, já assinaram quatro romances e atualmente trabalham num quinto título. As garotas, que concluíram o primeiro livro, O 
Diário de Uma Adolescente Mascarada, aos 15 anos, contam que a rotina de um jovem escritor tem horários apertados, mas é possível conciliar todas as tarefas se organizando e listando prioridades. “É bem agitado e cansativo, mas não dá para ficar inventando desculpa para não escrever. Nós trabalhamos, fazemos faculdade, cuidamos de um blog, vamos para a academia, escrevemos e ainda temos tempo de sair com nossos amigos”, afirma Monique.

O papel da internet
O nicho editorial feito
para e por adolescentes vem crescendo – e impressionando – cada vez mais. Em 2013, o segmento juvenil foi o que teve maior aumento percentual nas vendas em relação a 2012, com um salto de 24%, segundo a empresa de pesquisa de mercado GfK. Entre as novas estrelas do gênero está a blogueira Bruna Vieira, de 19 anos, famosa entre o público jovem por ser criadora da página Depois dos Quinze. Com uma compilação dos melhores textos do blog e seu primeiro romance, De Volta aos Quinze, ambos publicados pela Editora Gutenberg entre 2012 e 2013, a mineira alcançou a expressiva marca de 60 mil exemplares vendidos no fim do ano passado, graças à visibilidade alcançada através da internet.

Espaços online aparecem como uma vitrine democrática para escritores. No blog que carrega o nome de sua trilogia,
Elfos Urbanos, Eduarda Kiame posta crônicas e pequenos textos de opinião, além de estabelecer uma proximidade com seu público. “Tenho um retorno e um contato muito legal com os leitores via internet”, conta. Já para as irmãs Sperandio, que mantém o blog Gêmeas Escritoras, a web representa muito mais do que um canal de comunicação com os fãs. Mônica e Monique, que começaram a escrever aos 14 anos, deram o pontapé inicial da carreira no mundo virtual através da postagem de fanfics, histórias alternativas baseadas em personagens de livros famosos como, por exemplo, a saga Harry Potter. “Fanfics são uma ótima base para quem quer começar porque além de treinar a escrita, tornam possível receber um feedback dos leitores”, explica Mônica.


Mônica e Monique Sperandio lançam "Sete Vidas", romance mais famoso da carreira (Foto: divulgação)

Início da carreira

Segundo o último levantamento da Câmara Brasileira do Livro, o Brasil tem apenas 750 editoras de livros comerciais ativas. Nesse cenário, encontrar um editor pode acabar se transformando numa tarefa árdua e exaustiva. Para Monique Sperandio, essa é a parte mais difícil do processo. A irmã, Mônica, complementa: “É preciso pesquisar bastante antes de enviar a sua obra para qualquer editora. É necessário ter em mente que você não está prestando um favor a eles. Não é uma brincadeira, é um negócio em que ambos os lados têm que cumprir prazos. Isso serve para qualquer idade”.

Encontrar uma editora confiável para enviar um manuscrito é apenas a primeira etapa. Nas maiores empresas do ramo, é comum haver uma saturação de originais. A lista de espera faz com que cada trabalho demore muito tempo para ser avaliado. A assistente editorial do Grupo Autêntica, Carolina Christo, 23, explica que é mais fácil contratar um agente literário para cuidar do envio do manuscrito do que fazer isso por conta própria: “O agente é uma pessoa com contatos no mercado editorial e que funciona como ponte entre o autor e a editora. Se esse profissional gostar do texto, se dispõe a encontrar uma editora e a cuidar da carreira do escritor”. Na internet, é possível encontrar listas de agentes nacionais e internacionais. Porém, é importante fazer uma pesquisa antes de assinar o contrato. Checar a credencial e conversar com outros agenciados são boas dicas para garantir a segurança e a integridade do adolescente.


Christo trabalha para um conglomerado de quatro editoras, entre elas a Gutenberg, de Bruna Vieira. Para adolescentes aspirantes a escritores, ela recomenda que, antes de procurar um agente ou uma editora, os jovens autores busquem um grupo de leitores beta, isto é, que não possuam vínculo emocional com o autor do texto. Em fóruns como o do site
Escreva seu livro, é possível encontrar internautas dispostos a ler novos escritos sem cobrar nada por isso.

Aos jovens que gostariam de escrever, o jornalista e escritor Nelson Rodrigues dava um conselho intragável para a apressada geração Y: “Envelheçam depressa”. A dica de Mônica Sperandio, um pouco mais otimista, vai na contramão: “Se não der certo com uma editora, parte para outra. Tem que ter garra para continuar e sempre manter em mente que o melhor está por vir”.


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