quarta-feira, 14 de maio de 2014

Meninas poetas ganham voz em Curitiba


Grupo poético mescla liberdade de expressão feminina com as diferentes vozes que participam dele


Reportagem Fernanda Tieme Iwaya


Revolução

Ela vestia vermelho quando a revolução estourou
Não havia lua no céu, nem comida nos pratos
O caos se alastrava como inundação
Ela ouviu a primeira bomba explodir
E correu para o banheiro
Prendeu os seus cabelos o mais alto que pode
Passou rímel azul
Usou o resto do seu perfume
E colocou no pescoço seu velho talismã
O lenço que a sua avó e a sua mãe haviam usado
para cobrir seus rostos, ela usou amarrado na
cintura para esconder as armas que iria usar na luta
E quando pisou na praça não estava sozinha
Muçulmanas, católicas, pagãs, judias e famintas
Todas elas se encontraram de novo
E sem pedir permissão.

- Alexandra Barcellos

A criação de um grupo para a divulgação dos trabalhos poéticos e artísticos de mulheres que moram em Curitiba foi ideia das poetas Andréia Carvalho e Alexandra Barcellos, ambas motivadas pela chance de dar reconhecimento, visibilidade e incentivo ao talento feminino da cidade. “Durante uma conversa, surgiu um assunto sobre o fato do Google não saber quem são as mulheres que escrevem em Curitiba: em pesquisa que a  Andréia fez não encontrou muita informação – daí que surgiu nossa ideia de criar um grupo”, conta Barcellos.

Alexandra Barcellos, 44, nasceu em Foz do Iguaçú e é professora de literatura, produção textual e autora de cinco livros infanto-juvenis de temática ecológica, além de sonhar com a publicação de um livro com suas poesias. Andréia Carvalho é também formada em biologia e autora de dois livros de poesia neo-simbolista.
 
 
 Andréia Carvalho e Alexandra Barcellos: coordenadoras do grupo, tiveram a ideia para dar maior visibilidade às meninas que escrevem (Foto: Rocio Vaz)

No último mês de janeiro, surgiu o grupo que prefere não ter um nome, mas se utiliza do termo Meninas que Escrevem em Curitiba para sua representação. Nas palavras de Carvalho, a escrita abrange diversas formas de expressão, seja no papel, no pincel, na pauta, na luz, no corpo, nos temperos e no coração, daí a não necessidade de um nome específico para identificar estas escritoras.

Em torno do grupo, meninas de diferentes idades, profissões e talentos artísticos se unem em prol da poesia, seja ela falada, dançada, pintada, desenhada, cantada ou gesticulada. “Eu digo que não escrevo, brinco com as palavras”, conta a publicitária Rocio Vaz, 45, que pelo amor às palavras apreciou a ideia de ser uma das meninas que escrevem. Até o momento elas já são 163. As garotas foram recrutadas por meio de redes sociais, convites e indicações.

Para a escritora e artista plástica Josette Garcia, 53, era preciso uma maior representatividade feminina nesse contexto, e é isso que o grupo está trazendo. Elas fazem reuniões para discutir os futuros eventos poéticos, assim como variados assuntos relacionados ao universo feminino, compartilham ideias, poemas, fotografias, pensamentos, receitas, histórias e experiências. Os encontros ainda não têm lugar fixo, mas o grupo vem tendo apoio de diferentes espaços para fazer suas reuniões, como o Espaço Agendarte, a casa de Cristina Beduschi, o Mercado Livros, a casa Mímesis Conexões Artísticas e a Biblioteca Pública do Paraná – esse último, deverá ser o futuro espaço fixo das reuniões.

A ideia de priorizar a participação feminina, tanto artística quanto organizacional, busca justamente valorizar o trabalho intelectual feminino, por questões sociais e relacionadas ao próprio conforto das participantes: “Assim, elas podem agir como mulheres livremente”, explica a idealizadora Andréia Carvalho.

As poetisas já realizaram quatro apresentações – performances de declamação de poesia, podendo ser lida, cantada, dançada, ou o que cada participante preferir. Os saraus tiveram uma ótima recepção e repercussão, mas nem todas as participantes se apresentam. De acordo com Barcellos, há um número aproximado de 40 meninas mais ativas em relação aos eventos. Os espetáculos já tiveram como palco o restobar Dona Doida, o restaurante Mezanino das Artes, o Instituto Néo-Pitagórico e o Wonka Bar. A ideia é sempre homenagear grandes figuras femininas, como a já homenageada Mossa Bildner, norteamericana diretora de teatro e técnica vocal. Assim como realizar espetáculos de diferentes formatos e com convidados dos mais diversos meios, incluindo artistas de outras cidades.
 
O próximo espetáculo será realizado dia 22 de maio, com o apoio da Fundação Cultural, no Teatro Universitário de Curitiba – TUC. O “CuTUCando a inspiração” contará com a presença de aproximandamente 25 artistas do movimento poético. O sarau terá como tema a inspiração que cada uma possui e homenageará a tenente-dentista Luci Belão, curitibana que desenvolveu um comitê de Direitos Humanos para mulheres em situação de risco. 


Nos espetáculos é comum a divulgação dos trabalhos das meninas por outros meios, como varais poéticos e venda de livros de autoria das participantes (Foto: Rocio Vaz)

Como o grupo ainda está em formação não há um site oficial, e os contatos e eventos são feitos e divulgados através do Facebook.



Nenhum comentário:

Postar um comentário