segunda-feira, 2 de junho de 2014

Cineclubes incentivam formação de cinéfilos em Curitiba



Na contramão dos espaços de cinema multiplex, o Sesi é uma das instituições que promovem sessões gratuitas semanalmente, sob a curadoria de Miguel Haoni 

Reportagem: Júlio Boll


No dia 22, o Cineclube Sesi exibiu “A Divina Comédia”, do diretor português Manoel de Oliveira (Foto: Júlio Boll)

O frio e uma chuva fina assolaram Curitiba por volta das 19 horas do dia 22 de maio, quinta-feira. Nem por isso, cerca de 20 pessoas deixaram de se acomodarem nas poltronas de uma sala de multimídia no prédio da Sistema Fiep, no centro da cidade, movidos pela paixão e pelo interesse pela sétima arte. Ali começaria, em instantes, mais uma sessão do Cineclube Sesi, que conta com quase dois anos de existência.

“Hoje tem pouca gente, o tempo não ajudou. Mas eu sempre venho direto do trabalho desde agosto de 2013, quando fizeram um ciclo do diretor Wes Anderson, um dos meus favoritos”, conta o advogado Giovanni Comodo, 25 anos. Sob a curadoria do cinéfilo Miguel Haoni, um dos criadores da iniciativa movida pelo grupo artístico Coletivo Atalante, as sessões gratuitas acontecem todas as quintas e ocorrem em ciclos, que são de diretores, fases ou classificações críticas.

Os longas a serem assistidos são selecionados pelos próprios membros do cineclube, em votações que ocorrem sempre no primeiro encontro do mês. Além disso, a liberdade de expressão é evidente. Todos são convidados a opinar sobre impressões ao final de cada filme. “O retorno é interessante. Curitiba é difícil de conquistar, mas no Cineclube criamos um público fiel e bem diverso, que vem para participar e interagir”, detalha Haoni.

Na semana passada, o filme “A Divina Comédia” foi exibido e integrava o ciclo de cinema maneirista. Haoni explica que a fase é uma característica do cinema entre os anos 1970 e 1980. “Esta classificação é uma crítica, em um filme que mostra a saturação do cinema moderno e clássico, além de ter a problematização da representação”.

Guilherme Comodo (à esquerda) e Lucas Lourenço (à direita), com o curador Miguel Haoni (ao centro), são cinéfilos compulsivos. “Vim aqui por causa do diretor Wes Anderson e não parei mais de comparecer”, conta Guilherme.
Paixão desde pequeno e falta de iniciativa

O Cineclube Sesi, um dos existentes na capital paranaense, surgiu em 2012 e foi uma forma de reunir apaixonados pela sétima arte que se preocupam mais com o estudo dos longas e com seu conteúdo. “Ainda no Pará, fazíamos sessões com colegas da área, em 2007. Depois que me mudei para Curitiba, percebi que não existia algo desse gênero e combinou com o Sesi, que queria fazer algo parecido”, conta Haoni, que está cursando o 3º ano de Cinema da Faculdade de Artes do Paraná (FAP).

A paixão pelo cinema do atual curador começou cedo. “Fui criado com a TV, assistia filmes compulsivamente. Passei a estudar os títulos aos 14 anos e, com o Cineclube, achei o meu lugar no mundo”, acredita. Este amor pelos filmes, no entanto, não se atrela aos últimos lançamentos cinematográficos. “Prefiro estudar os filmes separadamente. Estamos vivendo tempos difíceis, com uma intensa falta de criatividade, por isso parei de seguir as grandes bilheterias”, confessa o estudante.

Sobre o cinema nacional e os investimentos na área cultural, Haoni é pontual e direto. “Os filmes brasileiros carecem de energia, de experiência de vida. Após a morte de Eduardo Coutinho, as coisas estão terríveis”. Para isso, ele confia em uma mudança neste cenário no caminho inverso: em pessoas que movimentam o cenário para atrair os governantes. “Falta iniciativa, estão surgindo ideias interessantes, mas ainda precisamos de maior produção crítica, para se desenvolver as artes localmente e com consistência”.

Já o cinéfilo Giovanni Comodo, um dos presentes no Cineclube, acredita que o problema seja outro: a distribuição. “Paguei caro para ver [o filme nacional] ‘Hoje Não Quero Voltar Sozinho’. Não há incentivo para o cinema brasileiro com melhores locais de exibição. Muitos dos filmes voltam em espaços desconhecidos e com pouca divulgação”, complementa o advogado. Por isso, ele acredita que os cineclubes podem ajudar a provocar mudanças na área: “Com os Cineclubes e um trabalho conjunto, este cenário vai mudar. Os envolvidos estão tomando seu rumo”, aposta.

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