quinta-feira, 5 de junho de 2014

Projeto de lei busca diminuir violência nas manifestações


A Lei Antiterrorismo tramita no Legislativo, mas é questionada quanto a sua relevância

Reportagem Fernanda Tieme Iwaya


As manifestações de rua que ocorreram no ano passado, em diferentes cidades do país, geraram preocupações no governo quanto a novas ocorrências durante os eventos esportivos que o país sediará: a Copa do Mundo, que se inicia em junho, e as Olimpíadas de 2016. Assim, projetos de leis tramitam no Congresso Nacional e medidas preventivas foram criadas, no intuito de prevenir o uso de violência em protestos pacíficos. No entanto, um projeto em especial, conhecido como Lei Antirrerorismo, tem causado dúvidas e discussões quanto sua aprovação e abrangência, dentro e fora no Senado.

O projeto de lei número 499 foi produzido por uma comissão mista de deputados e senadores, presidida pelo senador Romero Jucá (PMDB/RR) e pelo deputado Cândido Vaccarezza (PT/SP). Apresentado no final de 2013, considera terrorista aquele que provocar pânico generalizado e que ameaçar a vida ou a integridade física de outra pessoa. São enquadrados na lei também aqueles que praticarem terrorismo contra patrimônios públicos ou privados, incitação, formação e financiamento de grupo terrorista. A proposta estabelece condenações que variam de 3 a 30 anos de reclusão. A lei prevê penas de 8 a 20 anos para quem promover o "terror" em estações de trem, instituições de ensino e prédios do Poder Executivo, além de outros serviços essenciais. Em caso de incitar o terrorismo, a pena é de 3 a 8 anos e, para quem provocar ou difundir o terrorismo de alguma forma, pode ser de 15 a 30 anos de reclusão. Em caso de morte, a condenação é de 24 a 30 anos.



No ano passado, ocorreram várias manifestações pelo Brasil em fator do descontentamento com medidas do Governo que geraram reações do Legislativo (Foto: Marcos Solivan/UFPR)

Nesse contexto, a iniciativa, que ainda é debatida no Legislativo, é questionada pela possibilidade de ter como objetivo inibir que manifestações pacíficas de descontentamento ocorram para o país não ficar mal visto internacionalmente. A vice-diretora do Setor de Ciências Jurídicas da Universidade Federal do Paraná, Vera de Chueiri, explica que o projeto parte da premissa de que é importante o Estado usufruir da força repressiva para criar uma falsa ilusão de segurança para os que estão vindo prestigiar um evento grande como a Copa do Mundo. A vice-diretora ainda comenta que a iniciativa é uma tentativa de mostrar uma falsa estabilidade do Brasil para as outras nações.

De acordo com o senador Romero Jucá, em entrevista para o Portal de Notícias do Senado Federal, no entanto, o projeto de lei nada tem a ver com os movimentos sociais, e é um equívoco pensá-lo como forma de inibi-los. Ele afirma que a intenção é puramente oferecer ao país uma lei moderna e mais dura contra o terror, pois para quebra-quebra, violência nas ruas ou outras ilegalidades, existe o Código Penal, que prevê, por exemplo, dano ao patrimônio, lesão corporal e danos a terceiros. O senador Álvaro Dias (PSDB/PR) revela descontentamento à iniciativa do projeto e considera desnecessário, falho e atropelado, além de visar atender somente aos interesses da Fifa. “Isso fere a nossa soberania. É uma forma de desestimular a participação das pessoas em manifestações de descontentamento”, comenta Dias em publicação no seu site.

A criação do projeto é considerada exagerada em um país que não apresenta históricos de terrorismo. “É preciso definir bem o conceito do termo, que é muito complexo, antes de ser abordado dessa forma”, diz Chueiri. A especialista ainda esclarece que a medida pode ferir direitos constitucionais dos cidadãos, pois tudo o que impede que algum movimento se expresse tira o direito de livre manifestação, o que viola um direito fundamental.

Sobre o uso de violência em manifestações, o cientista político e professor de sociologia da UFPR, Ricardo Costa, afirma que é motivado pela falta de representatividade e fragilidade política de pequenos grupos. O estudante de direito e participante de protestos André Heige, de 31 anos, discorda. Ele acredita que o uso de violência – pelo menos contra coisas, e não pessoas – é uma tática dos manifestantes de mostrarem seu descontentamento. “As pessoas usam violência quando se sentem violadas”, afirma Heige.

A solução, de acordo com Vera Chueiri, é o uso e aproveitamento das políticas públicas já existentes para lidar com a violência contra pessoa e bens dentro das manifestações. “Nós temos os instrumentos para poder tomar as providências, as políticas públicas e o treinamento dos policiais e agentes de segurança existem”, diz.

O jornalista e professor de Comunicação Social, que estuda os movimentos sociais, Mário Messagi, acredita que a intenção da Lei Antiterrorismo pode ser assegurar que os black blocks – grupo de pessoas que vandalizam e têm atitudes violentas durante protestos pacíficos – não aconteçam como em junho de 2013, mas consequentemente, a lei poderá inibir movimentos de descontentamento pacíficos. As manifestações que causaram receio no Senado aconteceram em junho do ano passado em fator do descontentamento da população com os governos federal, estaduais e municipais, em relação a variados temas políticos e sociais, e teve como estopim o aumento das passagens do transporte público, envolvendo vários governos municipais.

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